Grande Otelo, Renato Aragão, Cantinflas, Oscarito… Os cinemas de rua do Centro de Manaus homenagearam lendas populares da Sétima Arte durante as décadas de 1980, 1990 e início dos 2000. Carmem Miranda também foi uma delas: a sala localizada na rua 24 de Maio, esquina com a rua Joaquim Sarmento foi inaugurada no dia 20 de novembro de 1986 com “A Hora do Lobisomem”, terror roteirizado por Stephen King. Somente na primeira semana mais de sete mil espectadores estiveram no cinema. 

O maior frequentador do local morava na rua do cinema. Michel Guerrero ia praticamente todos os dias no Cine Carmem Miranda para assistir e reassistir aos filmes, anotando tudo em um caderninho. A relação era tamanha que ele até ajudava na troca dos cartazes da sala gerida pelo empresário Joaquim Marinho. Esta paixão virou um curta-metragem lançado em 2021 chamado “Cine Carmem Miranda” e, agora, ganha um novo capítulo. 

Michel Guerrero está à frente da retomada do Cine Carmem Miranda, agora, como um cineclube gratuito com sessões de quinta à sábado a partir das 17h. O espaço fica localizado em plena Praça do Congresso, n.º 10, a poucos metros da Biblioteca Municipal, no Centro de Manaus. O projeto contemplado no edital da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Amazonas através de recursos da Lei Paulo Gustavo visa ser um novo espaço para exibição de obras clássicas e cults, além promover debates e ciclos temáticos de filmes. 

DE ADANILO A MARLON BRANDO 

A abertura aconteceu na semana do Festival de Parintins: “A Caixa de Pandora” marcou a sessão inicial para o público em geral. O clássico mudo de 1929 dirigido por Georg Wilhelm Pabst, foi exibido em uma dobradinha com o francês “Três Noites por Semana”, de 2022, em uma programação voltada para celebrar o Dia do Orgulho LGBTQIAPN+, em 28 de junho. Já no sábado (29), teve a exibição de curtas de George Mélies seguida de debate com o professor de teatro da UEA, Jorge Bandeira. 

A semana seguinte já reserva uma homenagem ao ator amazonense Adanilo (4/7), filmes sobre a música no cinema francês (5/7) e a celebração ao centenário de Marlon Brando com “Viva Zapata” e “Sindicato de Ladrões” (6/7). Nas próximas semanas, ainda haverá um ciclo dos ganhadores de Melhor Filme do Oscar por décadas. 

EXPECTATIVAS E ESPERANÇAS 

Com apoio da Aliança Francesa Manaus e Instituto Cultural Hiléia Amazônica, a retomada do Cine Carmem Miranda traz de 42 a 50 lugares. “O espaço funcionava como um auditório e foi adequado para cinema. Aproveitamos, inclusive, parte da decoração. Serão seis meses de exibições como está proposto na Lei Paulo Gustavo, mas, o intuito, claro, é continuar”, disse Michel Guerrero. 

Com larga trajetória no teatro amazonense, Geraldo Langbeck está ao lado do amigo de mais de 30 anos na empreitada de trazer o Cine Carmem Miranda de volta. “Sou um faz-tudo aqui”, brinca em conversa na tarde de abertura. “O cinema retorna pela necessidade de se ter um cinema alternativo, de arte em Manaus. Antes havia com o Cine Qva Non e o Cinema 2, mas, isso se perdeu nos anos 1980. De lá para cá, acabou – o cinema de shopping, neste sentido, foi uma desgraça porque simplesmente não passa nada de filmes de arte. Poucos filmes brasileiros são exibidos. Os filmes europeus, asiáticos ficam sem nada”, declarou. 

Cine Carmen Miranda foi aberto no dia 20 de novembro de 1986 e recebeu 7 mil espectadores na primeira semana.

Langbeck, entretanto, mantém os pés no chão: “moro em São Paulo há muito tempo e cineclubes quase nunca lotam. Cinema de arte é um público restrito mesmo. Ainda assim, esperamos atrair a garotada do colégio. Quem sabe não gostam daquilo que não conhecem como, por exemplo, filmes mudos?”, completou.