Mentirosa compulsiva, Greice, a personagem título, parece inventar certas histórias para tirar algum sentido do acaso. Inventa que vai gravar um videoclipe para descolar uma piscina em um dia quente de Lisboa. Acaba gravando o vídeo. Como se manifestasse uma realidade a partir de sua imaginação. Faz o mesmo algumas vezes depois. Com seu relacionamento. Com sua volta forçada para Fortaleza. Mentindo sempre. Na documentação. Nas conversas. Até pra si nos diários de adolescência. 

Não por mal mas porque talvez tenha algo que não cabe em si pra por pra fora. Algo que simboliza uma certa imaginação inconsequente que a extrapola. E que de algum jeito fala do processo artístico de se expressar sem parar e por todos os meios possíveis. Que é o que quase todos os personagens fazem de um jeito ou de outro. Em um filme que captura ao mesmo tempo algo como uma juventude muito específica.

(incorrendo aqui no papo de velho de “esses jovens…”)

Mas a questão é que nem eu nem o filme julgamos a Geração Z ou ela. Primeiro grupo do mundo que cresceu em meio a estímulos infinitos ao redor. Que colocam informação pra fora da mesma maneira que consumiram. De todos os lados, o tempo todo e ao mesmo tempo. 

O texto é chamativo. Se destaca. Nas piadas de diálogo, nas camadas e camadas de causos e casos e mentiras e verdades contadas. Mas não preso a essa ideia da comédia textual, o filme vai mais além nessa toada pós-moderna. Adotando uma forma que tenta fazer sentido nesse espírito de caos que Greice tem. 

Com uma montagem que usa e abusa da descronologia e dos cortes que concretizam suas falas. Movimentando em raccords e elipses invertidos que fazem ela se levantar de uma cadeira agora e sair caminhando antes. Que movem a câmera pro lado e o cenário muda junto. 

Enquanto mesmo dentro das unidades de cenas, tudo é feito de uma certa fluidez. E sem quebrar muito o aspecto bem clássico da blocagem na forma como os elementos de cena se mantém. Criando camadas orgânicas dentro dos quadros tipo quando ela pula a janela e passa pela mãe dormindo.

Em uma cena, numa swingueira que rola em uma escola fechada às altas horas da noite, um plano sequência flutua pela coreografia e pelos personagens naquela quadra noturna. O que parece não pertencer à decupagem aparentemente desestruturada de tudo que o filme é até então mas que de algum jeito faz todo sentido ali. 

Algo semelhante ao que acontece em uma cena escura onde ela, enfurnada em um quarto de hotel quente do Ceará que faz passar por apartamento na Europa, para durante um longo momento. Sentada na cama e com uma máscara de gesso sem expressões cobrindo seu rosto. Num plano quase surrealista dessa menina se isolando por um instante de seus arredores ultra estimulantes. Antes que essa mesma realidade se molde novamente à suas histórias.

Se abrindo para um lado de sitcom na construção de suas situações, o filme não se conforma muito com o gênero de comédia de costumes. Se deixando levar. Muitas vezes sem rumo. Para uma incerteza que pode ser esquisita para alguns espectadores. Mas que é admirável também por isso quando se compromete com a desorientação da sua premissa.