A história da primeira mulher negra do Brasil a se formar em medicina não traz nenhum grande obstáculo ou particularidade pelo que o filme faz parecer. Além do óbvio. De uma formação em medicina de uma filha de uma mãe escrava liberta. 

Mas fora isso, ela aparentemente conseguiu pagar e concluir seus estudos. Praticar por um tempo. Ensinar. E eventualmente deixar tudo isso para “ser mãe”. 

“Quem é essa mulher?”, entretanto, é um documentário que parece querer encaixar a pesquisa da historiadora que fez esta descoberta em algo como uma escavação de uma grande aventura passada. Passando paralelamente mas sem nunca se referir direito ao que tem de realmente mais interessante no possível paralelo entre elas. Que é o fato de que muito dessa pesquisa e dessa construção se dá pela colaboração de acadêmicas e professoras pretas. 

De que, desde esse primeiro passo na academia. Desde esse pioneirismo. Com muito custo e décadas e décadas depois, a sociedade brasileira e baiana parece dar uma resposta a esses obstáculos históricos a partir de uma onipresença dessas minorias galgando os espaços acadêmicos.

Mas o foco que “Quem é essa mulher?” busca adotar é muito mais simplista. O de reconhecer nessa historiadora algo como uma moça estudiosa que chegou lá com muito trabalho. Deixando pelo caminho as possibilidades de filosofar mais sobre tudo isso em prol de um formato hiper banal de documentário. 

Com a alternância de entrevista e imagem de arquivo e a trilha que costura tudo e uma fotografia bem clara, bem de cartilha, bem direta. Preenchendo o filme de personagens que vão desde as acadêmicas citadas até um filho da médica e metade da família da historiadora. Dando mais a impressão de que o filme quer material para preencher sua duração do que dizer algo de específico. 

Com momentos em que, talvez percebendo esse marasmo, o filme tenta se pautar por urgências e obstáculos artificiais do tipo “fui à biblioteca e pedi um documento mas ele não estava disponível a princípio”.

(sendo que o documento estaria disponível dois dias depois ou coisa assim)

Deixando, no fim das contas, um ar de condescendência com essa pesquisadora e com a personagem histórica em que chega a mover o filme para certos discursos problemáticos. Como a conclusão no mínimo precipitada de que ela “foi feliz” quando largou tudo para ser mãe e dona de casa depois de casar. 

Felicidade essa inferida da impressão do filho e da platitude de quem fala no filme que “a mulher se ela quiser ela tem direito de escolher ser mãe” ou ocupar papéis tradicionais assim.

Como e se o longa temesse cair em problematizações que pudessem tirar Maria Odília do pedestal que construiu para ela. Que no fim das contas serve mais para nos afastar dela. Deixando a figura histórica artificial tomar o lugar da mulher de verdade.

Para um documentário feito por uma historiadora, “Quem é essa mulher?” não parece responder muito bem nem sequer sua pergunta título. Quem dirá todas as outras que podem surgir ao redor.